Reforma trabalhista completa 2 anos; veja os principais efeitos

A reforma trabalhista, que completa dois anos nesta segunda-feira (11), trouxe modificações nas relações de trabalho, porém, esbarra em questionamentos na Justiça, trazendo insegurança jurídica para colocar todas as mudanças em prática. Ainda assim, após três anos com saldo negativo, o país voltou a criar vagas com carteira assinada em 2018.
O número de reclamações trabalhistas caiu drasticamente nas varas de Trabalho, assim como os pedidos de danos morais, devido a mudanças que encareceram os custos para os trabalhadores em caso de perda da ação e pela limitação no valor dos pedidos de indenização, respectivamente.
Já o trabalho intermitente e as demissões por comum acordo, novidades trazidas pela reforma na forma de contratar e de demitir, apesar de terem registrado crescimento em relação ao ano passado, ainda registram adesão abaixo do esperado.
Veja abaixo os principais efeitos da reforma trabalhista após dois anos:
Reforma não gera os empregos esperados
A expectativa do governo era de que a reforma gerasse empregos formais. Após três anos com saldo negativo, o país voltou a criar vagas com carteira assinada em 2018, mas abaixo do volume dos anos anteriores à crise econômica. A taxa de desemprego segue persistente, e as vagas criadas são precárias – o aumento da população ocupada tem disso puxada pela informalidade.
A última taxa de desemprego divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) foi de 11,8% no trimestre encerrado em setembro deste ano, apenas 0,2 ponto percentual menor que a registrada no trimestre encerrado em novembro de 2017 (12%), quando a nova lei trabalhista passou a valer. Além disso, o número de desempregados nos dois períodos teve pouca variação: em novembro de 2017 era de 12,6 milhões; em setembro deste ano 12,5 milhões de brasileiros procuravam trabalho.


Taxa de desemprego desde novembro de 2017 — Foto: Arte/G1

Além disso, os dados do IBGE mostram que o aumento da população ocupada vem sendo puxado pela informalidade, com empregos precários, sem registro em carteira – em setembro, havia 38,8 milhões de informais –, equivalente a 41% do total de ocupados (93,8 milhões).

Já o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), que mostra o saldo de vagas formais criadas no país, mostra que no período entre novembro de 2017 a setembro de 2019 foram gerados 962 mil postos de trabalho, ainda abaixo da previsão do governo anterior, de gerar mais de 6 milhões de empregos no país.

No entanto, os anos de 2018 e 2019 voltaram a registrar saldo positivo de vagas, revertendo parte do quadro negativo dos três anos anteriores – em 2015, o saldo negativo chegou a 1,5 milhão de vagas. Veja abaixo:

Saldo de vagas formais — Foto: Arte/G1
Questionado pelo G1 se a melhora do saldo de vagas dos últimos meses se devia em parte à reforma trabalhista, o secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, atribui o crescimento à retomada da economia.

“A modernização trabalhista contribui para aumentar a segurança jurídica das contratações, com efeito positivo sobre o ambiente de negócios. A melhora nos números de emprego se deve à retomada do crescimento econômico, impulsionada pela agenda de reformas estruturantes”, informou por meio de nota.
12% das vagas criadas foram para intermitentes
A reforma trabalhista criou a modalidade de trabalho intermitente, que é uma prestação de serviços em períodos alternados, em que o trabalhador é remunerado de maneira proporcional, somente pelo período trabalhado. Além disso, a prestação de serviços esporádica deve ser registrada em carteira e há direitos trabalhistas previstos, como férias e 13º proporcionais e depósito do FGTS.
Desde a entrada em vigor da nova lei trabalhista, em novembro de 2017, até setembro deste ano, foram criadas 115,3 mil vagas na modalidade de trabalho intermitente, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério da Economia. O número de postos gerados representa 12% do total de vagas criadas no mesmo período no país (962 mil). Cerca de 70% dessas vagas foram abertas nos setores de comércio e serviços.
Em 2018, foram quase 52 mil vagas intermitentes, 9,4% do total de 545,6 mil postos criados. Já neste ano, apesar de a criação de vagas até setembro já ser maior que a do ano passado inteiro (762 mil vagas), 7,6% delas foram geradas para postos intermitentes (58 mil).
Ainda assim, até agora as contratações na modalidade estão bem abaixo da expectativa divulgada pelo governo na época da criação da modalidade, de criar 2 milhões de empregos em 3 anos, ou 55 mil vagas por mês.
No entanto, o saldo de vagas da modalidade (contratações menos demissões) foi positivo em todos os meses até agora – diferente do total de vagas formais, que chegou a registrar quedas bruscas em alguns momentos – veja abaixo:

Saldo de vagas de trabalho intermitente e total de postos criados — Foto: Arte/G1
Demissão por acordo tem baixa adesão
A demissão por acordo, uma das novidades trazida pela reforma trabalhista, registrou 342 mil desligamentos de novembro de 2017 a setembro de 2019.
Nessa modalidade, o empregado que pedir para sair da empresa poderá negociar com o patrão o direito a receber metade da multa de 40% sobre o saldo do FGTS e metade do aviso prévio. O empregado poderá ainda movimentar até 80% do valor depositado na conta do FGTS. No entanto, não tem direito ao seguro-desemprego.
O número de acordos oscilou bastante até o ano passado, chegando ao pico de 16,5 mil em outubro de 2018. Mas, a partir deste ano, passou a variar entre 18 e 19,7 mil desligamentos ao mês.
Em 2018, o total de demissões por acordo foi de 165,2 mil. Neste ano, até setembro, o número já chega a 170,1 mil. No entanto, as demissões por acordo neste ano equivalem a apenas 1,46% do total dos desligamentos (11,7 milhões). Em 2018, foram responsáveis por apenas 1,2% do total (cerca de 15 milhões).
Queixas trabalhistas despencam
A nova lei trabalhista trouxe mudanças para o trabalhador que entra com ação na Justiça contra o empregador. Entre as mudanças estão pagamento de custas processuais em caso de faltas em audiências, de honorários dos advogados da parte vencedora e de provas periciais em caso de perda da ação, além de ser obrigatório especificar os valores pedidos nas ações.

Outra novidade é o pagamento de multa e indenização em caso de o juiz entender que o empregado agiu de má-fé.
Na prática, o processo ficou mais caro para o empregado, o que inibiu pedidos sem procedência. Essa tendência é mostrada nos dados fornecidos pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST).
O número de processos novos nas Varas de Trabalho teve queda de 34,2% entre 2017 e 2018. Em novembro de 2017, quando a lei entrou em vigor, houve um pico no número de novas ações, totalizando quase 290 mil, o maior número entre todos os meses de 2016 e 2017. Já em dezembro de 2017, o número caiu para 84,2 mil novos processos. Desde então, o número de ações não voltou aos mesmos patamares dos anos anteriores de mais de 200 mil processos ao mês. Em 2019, o maior número de processos foi em maio: 173.745.
Pedidos por dano moral recuam
A reforma trabalhista impôs limite aos valores dos pedidos de indenização por dano moral, que passou a ser de no máximo 50 vezes o último salário do trabalhador. Além disso, se o juiz entender que houve má fé, o autor da ação pode ser multado em 10% do valor da causa.
Com isso, o número de pedidos relacionados a danos morais despencou, segundo dados fornecidos pelo TST. Entre 2017 e 2018, a queda foi de 58,6% – passou de 753,5 mil processos para 311,6 mil. Neste ano, até setembro, são 247,6 mil ações referentes ao tema.
Em novembro de 2017, o número já havia despencado para 14,9 mil ações – queda de 81% em relação a outubro do mesmo ano (78,8 mil). Os números, que se mantinham no patamar de 70 mil ações ao mês em 2017, não passam de 30 mil desde 2018.
Além disso, a proporção das ações por dano moral dentro do total de processos está em 18% desde que a lei entrou em vigor. Antes da reforma, a proporção ficava entre 30% e 40% do total.
Arrecadação sindical despenca
Antes da reforma, o recolhimento da contribuição dos trabalhadores aos sindicatos era obrigatório e descontado na folha de pagamento. O valor, equivalente ao salário de um dia de trabalho, retirado anualmente na remuneração do empregado, era direcionado para a manutenção do sindicato da categoria.
Com a nova lei, o pagamento da contribuição sindical não é mais obrigatório. A empresa só pode fazer o desconto com a permissão do empregado.
Com isso, a arrecadação sindical (somando centrais, confederações, federações e sindicatos) caiu 86% de 2017 para 2018, segundo informações da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, passando de R$ 2,027 bilhões em novembro de 2017 para R$ 281,2 milhões em novembro de 2018. A secretaria informou que ainda não tem os dados consolidados de 2019.
Em junho de 2018, o Supremo Tribunal Federal (STF) negou os pedidos para tornar novamente obrigatório o pagamento da contribuição sindical pelos trabalhadores. A Corte analisou 19 ações diretas de inconstitucionalidade de entidades sindicais contra a regra da reforma trabalhista que tornou o repasse facultativo, em que cabe ao trabalhador autorizar o desconto na remuneração.
Apesar da queda na arrecadação, o número de sindicatos no país teve um ligeiro crescimento no mesmo período, passando de 17.137 em novembro de 2017 para 17.519 em novembro de 2018 – alta de 2,2%. A Secretaria Especial informou que ainda não tem os dados consolidados de 2019.
Entrave nos acordos coletivos
A nova lei trabalhista trouxe a possibilidade de os acordos coletivos prevalecerem sobre o que determina a lei em pontos que não estão previstos na Constituição, como jornada de trabalho, banco de horas e participação nos lucros e resultados. A mudança acabou trazendo impasses nas negociações entre as empresas e os empregados, já que os sindicatos alegam que os empregadores estão aproveitando a possibilidade trazida pela reforma trabalhista para retirar direitos trabalhistas anteriormente previstos nos acordos e convenções.
As convenções precisam ser aprovadas pelos sindicatos dos trabalhadores e patronais da categoria para ter validade e, por isso, tendem a ser mais difíceis de serem concluídas. Já os acordos envolvem apenas o sindicato e a empresa.
Outro entrave para a concretização das negociações tem sido a interpretação pelos sindicatos em relação à possibilidade de cobrança da contribuição sindical, de acordo com o professor da Universidade de São Paulo (USP) e responsável pelo Salariômetro, boletim de informações trabalhistas da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), Hélio Zylberstajn. A dúvida é se ela pode valer para todos se aprovada em assembleia.
Segundo números do Salariômetro/Fipe, a quantidade de negociações concluídas teve queda de 17% de 2017 para 2018. No acumulado de janeiro a setembro de 2018, a queda chegou a 23,3% em relação ao mesmo período de 2017, mas em 2019 houve aumento de 5% em relação a 2018.
“A queda de 2018 em relação a 2017 foi grande, e diminuiu em 2019, indicando que as partes estão encontrando formas para superar o impasse”, diz Zylberstajn.


Números de negociações coletivas — Foto: Arte/G1

Ações que reduzem direitos são paralisadas
Desde o mês passado, estão suspensas pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) as ações trabalhistas que tratam de redução de direitos não previstos na Constituição por meio de acordos coletivos, colocando em jogo a prevalência da negociação sobre a lei, uma das premissas da reforma.
A reforma trabalhista prevê que a negociação entre empresas e trabalhadores prevalecerá sobre a lei em pontos como parcelamento das férias, flexibilização da jornada, participação nos lucros e resultados, intervalo, trajeto até o trabalho fora da jornada, banco de horas e trabalho remoto. No entanto, benefícios como FGTS, salário mínimo, 13º salário, seguro-desemprego e licença-maternidade não podem entrar na negociação coletiva por estarem na Constituição.
A questão veio à tona porque é questionado se esses acordos coletivos acabarão sendo desvantajosos para os trabalhadores, como o trajeto até o trabalho não computado como jornada. Agora, é aguardada uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o tema.

Um dos pontos que gerou insegurança no meio jurídico foi se a reforma valeria também para os contratos de trabalho antigos, celebrados antes das mudanças. Em junho de 2018, instrução normativa do Tribunal Superior do Trabalho (TST) estabeleceu que só os novos contratos devem ser submetidos à reforma.
Pontos da lei trabalhista estão sendo questionados no Supremo Tribunal Federal (STF) por meio de Ações Diretas de Inconstitucionalidade, as chamadas ADIs. Atualmente, há 16 ações esperando por decisões dos ministros do STF. Até o momento, foram julgados dois temas pelo Supremo: o fim da contribuição sindical obrigatória e o trabalho de grávidas e lactantes em atividades insalubres. Desde agosto de 2017, antes da nova lei trabalhista entrar em vigor, o STF recebeu 36 ADIs, segundo levantamento feito pelo G1.
Entre as 16 que faltam ser julgadas, a maior parte trata da modalidade de trabalho intermitente (5) e limite de valores de indenização por dano moral (4). Entre os outros temas estão jornada 12×36 por meio de acordo, honorários de sucumbência, homologação da demissão sem a participação dos sindicatos e o reajuste de créditos trabalhistas e depósitos recursais.
Fonte: G1

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